*DISCURSO SEM VERBOS*
AIANDA QUE pareça incrível, eis um artigo em que não se encontra um único verbo. Transcrevemos essa obra prima de redação, traduzida de um artigo publicado em “LE PETIT JOURNAL”, da França, no ano de 1897:
“VERBOS! Cousa intolerável da convenção antiga e ridícula para o atulhamento da frase, geralmente viva, leve e clara, sem eles! Invenção antipática e com a complicação de acordos e não-acordos de particípios; armadilha, aliás, pérfida para os exames de gramática. Por que não a supressão do verbo antes da reforma da ortografia? Além disso, que lição maravilhosa para nós a ausência deles num grande número de adágios da sabedoria humana! Exemplo: “Pequenas causas, grandes efeitos” etc. Que facilidade de trabalho, para as memórias rebeldes, nessa concisão de forma! Nenhuma palavra em excesso; nada de fútil, de embaraçoso; a essência concentrada da frase, com quatro ou cinco palavras: o “Liebig” o pensamento! Sim, o verbo eis o inimigo! Guerra contra ele! Morte aos indicativos, aos subjuntivos, aos imperativos, aos infinitivos, enfim, a tudo em “ivo” e, principalmente, ao terrível mais que perfeito do subjuntivo, triunfo dos belos falastrões do Sul, desde Avinhão até Caracole. Em lugar das odes na Academia, na Comédia Francesa, na inauguração da ponte Alexandre III, por que não um simples cumprimento, sem verbo, ao tsar e à tsaritisa? Novidade apreciável, certamente, para tais festas, notáveis pelas surpresas, pela decoração das ruas, pelo engrinaldamento das fachadas, pela floração artificial das árvores sem folhas, na praça central dos Campos Elíseos. Uma saudação sem verbo, ao tsar, que maravilhosa resposta à invasão desta estranha literatura do Norte, mas arrogante de seus sucessos ibsenianos entre nós e de sua influência fantástica nos costumes do nosso teatro! Que desafio ao mundo intelectual dos outros países! Que assombro no universo inteiro: a supressão do verbo na literatura da França! Coragem e confiança no progresso! Esperança, sobretudo, da mudança completa das regras gramaticais. E qual melhor surpresa, para a inauguração da Exposição mundial de 1900, que a ausência total do verbo – mesmo do mais útil na aparência – nos votos de boa vinda do Presidente da República da época – (sem dúvida o mesmo de hoje) – aos seus imperiais visitantes: Nicolau II, o xá da Pérsia e Menelik, os três bons amigos da França!”(ESPÍNDOLA, Itamar de Santiago. No Mundo das Excentricidades)
*POESIA SEM A LETRA “O”*
SURGE fresca a madrugada,
Resplandecente de luz…
Salta alegre a passarada,
Num chilrear que seduz!
AS FILHAS da primavera,
De matizes deslumbrantes,
Enfeitam a natureza,
Sempre belas e radiantes.
A HUMANIDADE se curva,
Reverente e agradecida,
Ante a grandeza de Deus
Que à gente dá luz e vida.
NA IMENSIDADE das águas,
Nas várzeas ilimitadas,
Nas matas as mais agrestes
Nas serras e nas baixadas…
NESSE ambiente agradável
De paz que alegra e seduz,
Transparece claramente
A grandeza de Jesus!
NAS MARGENS de uma ribeira
Que desliza mansamente,
Canta um triste sabiá,
Uma balada plangente!
NAS ÁGUAS claras e lisas,
Nadam cisnes de alvas penas
Nas barrancas verdejantes,
Nascem lindas açucenas.
CAI A TARDE… nasce a lua,
Deusa de luz prateada,
Entre milhares de estrelas,
Na imensidade azulada.
PARA A ERMIDA singela,
Erguida na freguesia,
Seguem crentes a rezar
À Virgem Santa Maria!
(No Mundo das Excentricidades, ESPÍNDOLA, Itamar de Santiago)
*DOIS SONETOS… SENDO UM O AVESSO DO OUTRO.*
O DIREITO
A VIDA ao tempo rende o fraco e forte,
Do fado universal a prende o lanço;
Que estado achará triste?qual remanso?
Subida mais, a glória abate a morte.
DEVIDA e justa lei de humana sorte;
Cansado busca em vão o homem descanso.
Irado o Céu o oprime manso;
Erguida a espada vai azando o corte.
EM PENA muda a morte o gosto à vida;
A morte tudo abala e desordena.
Ao gosto a morte pois enfreia o passo.
PENA mortal à culpa foi devida;
Sorte alegre porém, alegre pena.
Posto na morte está a vida o passo!
O AVESSO
O FORTE e o fraco rende ao tempo a vida;
O lanço a prende universal do fado.
Remanso qual (triste) achará? que estado?
A morte abate a glória mais subida.
SORTE de humana lei justa e devida,
Descanso o homem, em vão busca cansado.
Manso e manso o oprime o Céu irado;
O corte azando vai a espada erguida.
A VIDA o gosto a morte muda em pena;
Desordena e abala tudo a morte.
O passo pois enfreia a morte ao gosto.
DEVIDA à culpa mortal pena;
Pena alegre porém, alegre sorte;
O passo à vida está na morte posto!
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